Texto Argumentativo Acerca do Poema de Fernando Pessoa:
“ Sou um Evadido”
Não há Homem à face deste mundo que não tenha já questionado o sentido da sua própria existência. Sendo que a certo ponto das nossas vidas, quase invariavelmente, acaba por se nos impor uma necessidade de adoptar diferentes atitude que motivem a nossa frugal passagem pelo Mundo. Fernando Pessoa, ortónimo, homem como os demais, poeta exímio como ninguém, tem a habilidade de, em poucas e sóbrias palavras, sintetizar esta questão de índole ontológica quando, no seu poema «Sou um evadido», declama: “Se a gente se cansa / Do mesmo lugar, / Do mesmo ser / Por que não se cansar?”.
Comecemos por olhar-nos antes de olhar em redor: a necessidade da mudança é inerente à condição humana, e compreendê-lo não nos é difícil se pensarmos em todas as vezes que nós próprios já sentimos a necessidade de mudar, de nos transformarmos a nós, à forma como nos apresentamos – mudamos a forma de vestir, mudamos o nosso cabelo, mudamos o nosso quarto, a nossa casa - porque como indivíduos que somos, crescemos, envelhecemos, moldamos o nosso carácter; de tal modo que existe uma constante necessidade de que o nosso ser social, a persona com que nos apresentamos aos outros corresponda ao “eu” interior. A mudança é por isso consequência necessária e indispensável do processo de maturação de todos nós, indivíduos.
É preciso ainda encarar a mudança como um meio para atingir um fim. Na poesia de Fernando Pessoa ortónimo surge-nos recorrentemente a ideia do “além”, daquilo que está sempre mais à frente, atrás do muro, depois da esquina. É essa noção que alimenta o sonho – a ideia de que, mudando alguma coisa nas nossas vidas conseguimos controlar o seu rumo e direccioná-la de encontro àquilo que desejamos: também nós, quando queremos atingir reconhecimento, tomamos uma diferente atitude em relação ao trabalho e ao esforço; se ambicionamos um estilo de vida diferente, mudamos de casa, de cidade, de país; se não nos sentimos felizes achamos que a felicidade depende daquilo que fazemos na vida, então mudamos de profissão, deixamos tudo para trás e vamos em busca daquilo que nos preenche. É esta a essência do sonho: a possibilidade de lutar por um propósito que nos complete, independentemente da sua tangibilidade. E qual é o Homem que nunca sonhou?
É agora possível compreender a estrofe de Pessoa: todo o homem se questiona acerca do fundamento do ser, reflecte sobre a sua existência, na sua maioria involuntariamente; e da mesma forma, todo o homem sente que a mudança é necessária, em prol de atingir um objectivo maior ou simplesmente a fim de satisfazer a sua evolução pessoal e se sentir completo. No entanto, Fernando Pessoa não é um indivíduo como os demais - porque toma consciência desta reflexão ontológica, sente um ímpeto constante que o obriga a procurar a sua identidade. Daí que, se o homem comum se cansa de estar sempre no mesmo lugar, mesmo que isso não lhe pareça nada de mais, o poeta assume e mentaliza uma premência maior, superior: sente a necessidade de ser outros, de ser extraordinariamente plural, ser todos mesmo que isso implique nunca ser realmente ninguém.
Ana Rodrigues
Aluna número 1 do 12º H de Artes Visuais
Quarta, 6 de Outubro de 2010
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